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Atenção primária à saúde

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O que é a Atenção primária à saúde

A atenção primária é uma forma de organizar o atendimento de saúde de forma a atender à maior parte das necessidades de uma população de forma regionalizada, contínua e sistematizada. Isso é feito integrando ações preventivas e curativas no atendimento a indivíduos e comunidades.

A primeira definição de APS surgiu após a Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1978. Eis o que diz o documento emitido ao final do evento, conhecido como Declaração de Alma-Ata: “Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e automedicação.”


Ainda de acordo com a definição da OMS, a atenção primária representa o primeiro nível de contato com o sistema, responsável por levar os cuidados de saúde o mais próximo possível dos lugares onde pessoas vivem e trabalham.

Qual o objetivo da atenção primária em saúde? Basicamente, a atenção primária deve funcionar como uma espécie de filtro capaz de organizar o atendimento e o fluxo dos serviços nas redes de saúde, dos mais simples aos mais complexos.

Por ser a “porta de entrada” dos usuários no sistema, a APS tem como objetivo divulgar orientações sobre a prevenção de doenças e a promoção da saúde, solucionando possíveis agravos e direcionando os casos mais graves para níveis de atendimento especializado.

Os quatro atributos da atenção primária Segundo a professora Barbara Starfield, médica norte-americana considerada uma das principais referências mundiais no tema, existem quatro atributos básicos que devem estar presentes nos serviços de atenção primária à saúde:

  • Atenção ao primeiro contato: O que se espera da atenção primária em saúde é que ela seja o serviço de saúde mais acessível à população, em todos os sentidos. E que, por isso mesmo, seja o primeiro recurso a ser buscado a cada novo problema ou novo episódio de um problema recorrente. Neste aspecto, é importante que os seus usuários em potencial percebam o serviço como acessível, seja no tocante à localização geográfica ou quanto aos horários de funcionamento, e isto se reflita na sua utilização.
  • Continuidade do atendimento: A continuidade do serviço de APS pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e o seu uso frequente ao longo do tempo. Esse atributo também é conhecido como “longitudinalidade” do atendimento. A pessoa atendida deve manter o vínculo com o serviço para que possa ser atendida de forma mais eficiente que quando uma nova demanda surgir. Este vínculo deve se converter em fortes laços de relacionamento com o beneficiário, capazes de refletir a cooperação mútua entre as pessoas e os profissionais de saúde. Para que isso aconteça, a unidade de atenção primária deve ser capaz de identificar a população eletiva, bem como os indivíduos dessa população que deveriam receber seu atendimento no local. É importante se certificar de que os indivíduos identificados como usuários considerem a unidade de saúde uma fonte regular de atenção e a utilizem periodicamente. Todas as consultas devem ocorrer na unidade, exceto quando for necessário consultar um especialista ou fazer algum exame específico.
  • Integralidade do serviço: A integralidade do serviço implica que as unidades de atenção primária devem oferecer todos os tipos de serviço que lidem com sintomas, sinais e diagnósticos de doenças manifestas, mesmo que parte dos pacientes sejam posteriormente direcionados a outros níveis de atenção. Isso inclui o encaminhamento para consultas com médicos especialistas e para o manejo definitivo de problemas específicos, bem como para serviços de suporte como a internação domiciliar. É importante garantir que, mesmo que o paciente seja encaminhado a outras unidades, o serviço de atenção primária continue corresponsável pelo seu atendimento. Além do vínculo com outros serviços de saúde, a atenção de nível primário pode incluir ainda a possibilidade de visitas domiciliares, reuniões com a comunidade e ações intersetoriais. Dessa forma, a integralidade também significa a ampliação do conceito de saúde para aspectos sociais, não se limitando ao corpo puramente biológico.
  • Coordenação (integração) do cuidado: Como já mencionado no tópico anterior, mesmo quando parte do atendimento se dá em outros níveis de atenção, cabe à equipe de atenção primária organizar, coordenar e integrar esses cuidados. Isso se deve ao fato de que esse tipo de atendimento costuma ser feito por profissionais de áreas diferentes ou terceirizados, com pouco (ou nenhum) diálogo entre si. Por isso, a coordenação dos cuidados implica em uma alguma forma de continuidade no contato entre os profissionais ou por meio de prontuários. Nesse contexto, é fundamental garantir que os problemas observados em consultas anteriores ou que tenham motivado encaminhamento para outros profissionais sejam constantemente avaliados. Este reconhecimento de problemas será facilitado se o mesmo profissional examinar o paciente durante o processo de acompanhamento ou se houver um prontuário médico com todas as informações pertinentes ao atendimento. [1] [2]

Equipe mínima para trabalhar com APS

Segundo as orientações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a equipe de profissionais para atuar na atenção primária deve ter caráter multiprofissional e interdisciplinar.

Sua composição mínima envolve um médico de família e comunidade ou especialista em clínica médica com capacitação e experiência em APS, além de um enfermeiro especialista em saúde da família ou generalista e outro profissional de saúde de nível superior.

Caso a carteira de serviços de atenção básica da sua operadora inclua procedimentos, é necessário contar ainda com um segundo profissional de enfermagem com formação superior ou técnica.

Outros profissionais de saúde podem ser agregados a este time básico, incluindo como fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas, fonoaudiólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais etc.

Tudo vai depender das condições de saúde abrangidas pela área de APS e das especificidades de cada projeto. Por exemplo, se a atenção primária na sua operadora incluir saúde bucal, então torna-se necessária a presença de um cirurgião dentista na equipe. [1] [2]

Atenção primária na saúde suplementar

Segundo a ANS, a implantação de redes de atenção ou linhas de cuidado em atenção primária é o caminho para que as operadoras de planos de saúde possam desenvolver um cuidado cada vez mais qualificado aos seus beneficiários.

A agência lançou recentemente o Projeto de Atenção Primária à Saúde (APS), que concede uma certificação às operadoras que cumprirem alguns requisitos pré-estabelecidos.

Vale notar que a participação nesse projeto é uma das formas de aumentar a pontuação no IDSS, o índice de desempenho da saúde suplementar mantido pela ANS.

O que a agência pretende com isso é demonstrar que investir em atenção primária é uma excelente oportunidade para as operadoras organizarem um sistema de gestão de saudáveis focado na prevenção e na promoção da saúde.

Algumas empresas estão inclusive lançando planos mais baratos no mercado, focados justamente na atenção básica. Quem adquire estes produtos deve fazer suas consultas sempre no serviço de atenção primária, que muitas vezes tem uma sede específica.

Chegando lá, o beneficiário vai ser atendido pela equipe de APS e, caso haja necessidade, será encaminhado para o atendimento com um especialista ou para fazer exames mais complexos. [1] [2]

Reduzindo custos assistenciais com a APS

Ao priorizar a atenção primária, os gestores das operadoras de saúde buscam aumentar o indicador de custo evitado, reduzindo o desperdício de recursos em casos que demandam apenas um atendimento de atenção básica.

Outro aspecto que mostra a importância da APS para a redução dos custos assistenciais é justamente sua função de “filtro”, possibilitando identificar entre a população atendida as pessoas mais indicadas para participar de programas de saúde.

Por isso, é fundamental que a operadora esteja devidamente equipada e organizada para fazer um levantamento do perfil de saúde da população atendida na APS. [1] [2]


Atenção primária em tempos de Covid-19

No Brasil, e em diversos países do mundo, a resposta sanitária tem sido centrada nos serviços hospitalares, com ações para a ampliação do número de leitos, especialmente, de unidades de tratamento intensivo e respiradores pulmonares. Sem retirar a importância da adequada estruturação da atenção especializada voltada aos casos mais graves da COVID-19, é preciso alertar que, no âmbito da atenção primária à saúde (APS), muito pode e precisa ser feito.

Na ausência de vacinas e de medicamentos específicos e devido à alta transmissibilidade da infecção, as únicas intervenções eficazes para o controle da pandemia são medidas de saúde pública como isolamento, distanciamento social e vigilância dos casos, com o propósito de reduzir o contágio, evitando sofrimento e morte, ao frear a velocidade da pandemia. Ao mesmo tempo é necessário dotar o sistema de recursos para oferecer a atenção adequada e oportuna 1.

Nesse sentido, a reorganização dos serviços de APS para, simultaneamente, enfrentar a epidemia e manter a oferta regular de suas ações é imperativa, e seu necessário protagonismo e readequação vêm sendo destacados em documentos e relatórios produzidos no país 2,3. Mesmo reconhecendo as diversas fragilidades de atuação das equipes, ressalta-se que a Estratégia Saúde da Família (ESF) é o modelo mais adequado por seus atributos de responsabilidade territorial e orientação comunitária, para apoiar as populações em situação de isolamento social pois, mais do que nunca, é preciso manter o contato e o vínculo das pessoas com os profissionais, responsáveis pelo cuidado à saúde.

O artigo ""Atenção primária à saúde em tempos de COVID-19: o que fazer?"" [3] analisa possibilidades de atuação dos serviços de APS na rede do Sistema Único de Saúde (SUS) que contribuam para o controle da epidemia e, simultaneamente, cumpram com a sua função essencial de garantir atenção cotidiana e capilarizada.

O artigo "Papel e condições de trabalho dos trabalhadores técnicos da atenção básica" mostra a importância desses profissionais, desde sua atuação nas ações educativas a testagem rápida, abordando as múltiplas atribuições dessas pessoas que estão na linha de frente no enfrentamento à pandemia. Mariana Nogueira, professora e pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) comenta que "Os ACS têm um papel importante na promoção de ações educativas em saúde sobre a Covid-19 e sobre medidas de prevenção ao novo Coronavírus junto aos usuários, assim como sobre a importância da adesão da população à imunização contra à Covid19". [4].

Sobrecarga da APS devido à COVID-19

A atual pandemia de COVID-19 vem ocasionando sobrecarga nos sistemas de saúde em todo o mundo e comprometendo as diversas esferas que compõem esses sistemas. Dentre elas, destaca-se a Atenção Primária à Saúde – APS que é responsável por realizar o primeiro contato com o usuário que procura o Sistema Único de Saúde – SUS. Assim, verifica-se que um grande número de casos do Novo Coronavírus aumenta a demanda no trabalho da APS, o que contribui para a saturação do sistema e dificulta a realização dos atendimentos/acompanhamentos que já eram pauta em seus serviços, surgindo e agravando as comorbidades clínicas. O artigo "Ensaio acerca das curvas de sobrecarga da COVID-19 sobre a atenção primária" [5] propõe apresentar o modelo das três ondas de sobrecarga da APS e discutir seu papel no atual momento de minimizar os impactos dessa demanda elevada e garantir à população os princípios que a regem. Com base na importância que a APS tem no suporte assistencial à população, conclui-se que, além de suprir a demanda espontânea, ela é uma ferramenta importante no achatamento das ondas de contágio e também na contenção das consequências indiretas do SARS-CoV-2.


Política de privatização da atenção básica

O ensaio "Previne Brasil, Agência de Desenvolvimento da Atenção Primária e Carteira de Serviços: radicalização da política de privatização da atenção básica?" [6] analisa documentos produzidos pelo Ministério da Saúde entre 2019 e 2020 para a reorganização da atenção básica: a nova política de financiamento (Previne Brasil), a Agência de Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Lei nº 13.958), a Carteira de Serviços e normatizações complementares. Buscou-se compreender como as mudanças projetadas nas funções gestoras e no modelo de atenção à saúde contribuem para o fortalecimento da lógica mercantil na política pública. Tomamos como parâmetros de análise as atribuições gestoras e os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) e de uma atenção básica orientada pela determinação social do processo saúde/doença, a concepção ampliada de saúde, o cuidado territorializado, o enfoque comunitário e a coordenação do cuidado numa rede integrada. As mudanças na alocação dos recursos públicos, a instituição de novas possibilidades de relação entre o Estado e empresas privadas e a adequação do modelo de atenção às particularidades da gestão de mercado revelam o sentido privatizante dessas medidas. A política assume um enfoque individualizante no que tange ao modelo de atenção e financiamento, enfraquecendo a perspectiva do território, o trabalho comunitário, o cuidado integral e multidisciplinar. Acelera-se a reconfiguração do SUS no sentido de um sistema no qual agentes públicos ou privados podem participar, indiferenciadamente, aprofundando a ruptura com o compromisso constitucional da saúde como dever do Estado.


Referências

1- APS EM REVISTA. A COVID-19 NA APS. APS em Revista, Belo Horizonte, 15 abr. 2020. Disponível em: https://apsemrevista.org/aps/issue/view/4

2- PREVIVA - http://previva.com.br/atencao-primaria-a-saude-aps/

3 - MEDINA, M. G. Atenção primária à saúde em tempos de COVID-19: o que fazer? Cadernos de saúde Pública, v. 36, n. 8, ago, 2020. Disponível em: https://scielosp.org/article/csp/2020.v36n8/e00149720/. Acesso em; 06 dez. 2020.

4 - TAVARES, Viviane. Papel e Condições de trabalho dos trabalhadores técnicos da atenção básica. Revista Poli: Saúde educação trabalho, ano 13, n. 76, mar./abr., 2021. Disponível em: http://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/poli_76_web.pdf. Acesso em: 16 mar. 2021.

5 - SAVASSI, LCM; DIAS BEDETTI, A; JOI DE ABREU, AB; COSTA, AC; PERDIGÃO, RM da C; FERREIRA, TP. Ensaio acerca das curvas de sobrecarga da COVID-19 sobre a atenção primária. J Manag Prim Health Care [Internet]. 27º de outubro de 2020. Disponível em: https://jmphc.com.br/jmphc/article/view/1006. Acesso em: 06 dez. 2020.

6 - MOROSINI, Marcia Valeria Guimarães Cardoso; FONSECA, Angelica Ferreira; BAPTISTA, Tatiana Wargas de Faria. Previne Brasil, Agência de Desenvolvimento da Atenção Primária e Carteira de Serviços: radicalização da política de privatização da atenção básica?. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro , v. 36, n. 9, e00040220, 2020 . Dispoível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2020000903002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 06 dez. 2020. DOI: https://doi.org/10.1590/0102-311x00040220.